Esta manhã assisti direto do Vaticano ao encerramento do ANO SANTO DA MISERICÓRDIA. Ou seja, durante o último ano a igreja católica trabalhou no mundo todo o ensinamento da Misericórdia, lição esta que é evidente no Evangelho. Diria até que é a própria alma do Evangelho, a tal ponto que as últimas palavras do Cristo martirizado, pregado na cruz, antes morrer são: “Pai, perdoa-os! Eles não sabem o que fazem!” E se esta é a grande verdade do Evangelho, não se aplica somente aos católicos, mas a todos os que se autodenominam cristãos. Sendo assim, pasmo diante de tanta farsa.
Farsa diária facilmente comprovada sem maior esforço nas condutas e discursos de tantos que se consideram cristãos. Alguns, nem todos, cumprem rituais em suas igrejas, devidamente aparamentados de roupas, bíblias e tudo o mais que considerem adequados e fora das igrejas se permitem toda espécie de raivas, cultivam ódios, se omitem diante das injustiças sociais ou abusos de poder, limitando-se à criticas que não os exponham, sem nenhum compromisso com a sociedade na qual vivem, na qual rezam...
Encerramento do ANO DA MISERICÓRDIA e o que vimos neste ano que se encerra? Preconceito, raivas, ódios, agressões verbais e não tão verbais, segregações e julgamentos de toda espécie disfarçados de verdades que não resistem a um mínimo de prudência, muito menos de misericórdia.
A “salvação” do homem está diretamente relacionada ao uso que faz de seu livre arbítrio. A Misericórdia Divina não nos libera da responsabilidade de nossos atos. Talvez essa seja realmente a maior expressão de sua Misericórdia: apesar de nossos atos nos da oportunidades de aprender e refazer até que eles sejam de fato a expressão do Amor.
Onde está a prática evangélica quando afirmamos que “bandido bom é bandido morto”? Onde está quando condenamos qualquer um por ser ou pensar diferente de nós? Onde está quando impomos com atos e palavras a “nossa” visão do mundo e dos fatos? Onde está quando expomos ao ridículo, à humilhação, ao descrédito público qualquer pessoa, porque somos juízes e carrascos? Onde está quando divulgamos e alimentamos atos que rotulam, discriminam, subestimam, ridicularizam, pessoas que fazem ou pensam diferente? Acaso participar dos ritos, fazer retiros espirituais, formar grupos de cantorias ou de orações nos torna imaculados? Acaso os rituais e festivais de músicas e encontros nos libera da prática evangélica no dia a dia?
A verdade cristã se mostra na forma como tratamos o outro. Não o outro que é igual a nós. Mas o outro que é diferente. Ser complacente e “irmão” daqueles que estão dentro de nosso próprio grupo é fácil. Mas se reconhece um cristão pela forma com que trata e atua com aqueles que estão fora da sua área de conforto. Os “samaritanos”, para usar uma expressão bíblica. E quem já leu sabe que eles eram profundamente mal vistos pelo “povo escolhido”. O próprio Cristo usa um samaritano como aquele que de fato amou ao próximo necessitado, numa de suas parábolas.
No ANO DA MISERICÓRDIA o que vi foi uma abundante intolerância. Pessoas deformadas por ódios absurdos, gente agredindo outras até pela cor da camisa, gente espancando outras por ser torcedores de times de futebol rival, pessoas debochando de outras ou as matando por suas escolhas sexuais, como num circo romano pedindo morte, armas, segregação e violências de todo tipo, membros da mesma família brigando por candidatos políticos diferentes, amigos se afastando por não aceitar o pensamento diferente do outro, até chegarmos ao ponto de constatar um pai matando um filho e se matando depois, somente por divergências políticas. Nem é preciso falar da total intolerância com aqueles que praticam uma religião diferente. Esses já são condenados até nos púlpitos.
A espiritualidade não é, nem pode ser uma farsa. Espiritualidade é prática, modo de viver e interagir. Espiritualidade é concretude de atos, não é um conjunto de orações, nem cantos. Espiritualidade é consciência do ser espiritual que nos habita e habita o outro. Sem essa relação não existe cristianismo, nem qualquer outro caminho espiritual A espiritualidade não é uma abstração! Não é um conceito! Não é uma banda que toca em nome do louvor a Deus! Espiritualidade é a forma amorosa com que trato a vida, com tudo que nela existe , goste eu ou não.
Cristina Manga
(in "Crônicas")
(in "Crônicas")
Excelente reflexão!
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