O que caracteriza o ser vivo é o seu condicionamento ao meio ambiente, e basta analisarmos as suas formas, cores, comportamento... Para perceber.
Esse condicionamento acontece por adaptação. O ser se adapta ao meio em que está, em que vive, sob pena de morrer, se não o fizer.
Da mesma maneira, educar é adaptar ao meio social, é condicionar ao meio social, e a educação consiste em levar o aprendido ao nível dos instintos, transformando iniciativas, atos, pensamentos... Em mecanismo natural, instintivo, de comportamento.
Por exemplo: a uma criança ensinamos a dar bom dia, pela manhã.
Essa criança se esquecerá e lembraremos, se esquecerá novamente e novamente lembraremos, e a cada vez que lembrarmos ela se lembrará que deve se comportar assim, até o momento em que o bom dia será automático, não antecedido de questionamento: porque tenho que dar bom dia? Ou de lembrar-se: tenho que dar bom dia, o bom dia será automático, no nível dos instintos e não mais do consciente, e diremos que esta criança está educada, condicionada a uma norma social.
Toda a nossa ideologia, seja no campo político, filosófico ou religioso, se formou por condicionamento, por educação.
Um sujeito, russo, chamado Ivan Pavlov, acreditava que essa educação, esse condicionamento, tinha desdobramentos, e de uma maneira radical, atingindo mesmo o orgânico, as nossas atividades biológicas e psíquicas.
E passou a fazer experiências com animais, principalmente com cães, para ver se a sua desconfiança se confirmava.
Uma delas, a mais clássica, consistia em tocar um pequeno sino a cada vez que fornecia alimento aos animais. Toda refeição era antecedida pelo toque do sino.
Era de se esperar que os animais associassem o som ao comer, o que realmente acontece, mas, eviscerando esses animais, Pavlov descobriu, como supunha, que o condicionamento vai além: o ouvir o sino não se resumia a só correrem em direção à fonte de comida, mas ao início do processo digestivo: secreção de saliva, secreção de suco gástrico, aumento do peristaltismo...
Como esse mecanismo, o da digestão, não é consciente, voluntário, Pavlov nos mostrou que mesmo o biológico, as atividades vitais e as vontades mais profundas e aparentemente desligadas da consciência, são condicionadas.
E chegamos ao bullying.
O bullying se caracteriza pelo condicionamento provocado por ações ou palavras incômodas, hostis, repetidas, como os sininhos de Pavlov.
O melhor exemplo de bullying está nos relacionamentos desgastados terminais, quando as virtudes não são mais percebidas e os pequenos defeitos e falhas são agigantados: com amor o amado está demorando a tomar banho, sem amor é um porco; com amor o amado está irritado por alguma coisa, sem amor é um grosseirão, estúpido; com amor a amada se distraiu e o feijão está salgado, sem amor nem pra cozinhar essa mulher serve; com amor a amada está indisposta ou com algum problema, sem amor essa peste é ruim de cama... Críticas tão repetidas, tão constantes que desenvolvem um mecanismo pavloviano.
Esta é a prática inconsciente do bullying, a consciente é valer-se de uma característica física ou comportamental e criticar, repetidamente, por brincadeira, a princípio, e sadicamente, depois.
A princípio vem a agressividade, como forma de reação, já que o ofendido não concorda com o que ouve, e depois a depressão, quando as acusações chegam ao subsconsciente do acusado, fazendo-o acreditar que é assim, tornando-se uma pessoa frustrada e triste.
E porque começo a semana com um artigo assim?
Tivemos um natal em quinta/sexta feiras, emendado com um fim de semana, e que vai se seguir à passagem do ano, com o país em crise.
As redes hoteleiras beiraram a lotação, na crise. As orlas marítimas ficaram apinhadas de banhistas, na crise. As estradas conheceram engarrafamentos monstros, em todo o país, em plena crise. O comércio de rua teve o mesmo desempenho do ano anterior, os shoppings tiveram queda de um por cento nas vendas, justificado pelo aumento de vinte e seis por cento de aumento nas vendas pela internet, numa crise danada.
Ora, a realidade desmente a crise, passamos, sim, por momento não tão favorável, como o resto do mundo, do qual não estamos separados, mas todos com a certeza de que estamos na maior crise da nossa história, e só nossa.
E ligamos a televisão: o dólar aumentou no mundo todo, mas nos fazem crer que só aqui, é a crise; dezenas de milhões empregaram-se, agora alguns milhares se desempregam, mas acreditamos que está todo mundo desempregado, é a crise; caiu a produção industrial, como em todo o ano, nessa época, o que deveria ser produzido já o foi, e vendido, para o mercado de natal, mas este ano foi por causa da crise; enchentes no sul, pioradas por causa da crise; seca no sudeste, esta crise está terrível...
Se a notícia é boa, auspiciosa, vem o alerta: apesar da crise...
A pesar da crise o número de universitários no Brasil dobrou, nos últimos dez anos; apesar da crise a indústria de chocolate quase dobrou a produção neste natal; apesar da crise as praias estiveram cheias nesse feriado.
Se no programa de variedades dão a dica de culinária ou de artesanato, vem o conselho, aprenda e ganhe um dinheirinho, para contornar a crise, e no programa de humor a piada é sobre a crise.
A palavra crise tem, hoje, para o brasileiro a mesma função do som dos sininhos de Pavlov, de condicionante, associando tudo ao ruim, nefasto, prejudicial, ainda que crise e desempenho econômico se mostrem tão contraditórios quanto sino e digestão.
Se a palavra crise é o som do sino, a mídia é o sino, ou o operador do sino.
E a repetição, intencional, muito bem planejada, ganha característica de bullying, a princípio desencadeando a violência, que tem se manifestado nas ruas em agressões verbais contra artistas, políticos, intelectuais... E nas redes sociais, com trocas de acusações altamente ofensivas, chegando ao inconsciente coletivo (Gustav Young), levando à depressão, quando, aí sim, estará materializada a crise.
O Brasil está sendo vítima de um bulliying social e seu agente ativo é a mídia, onde criminosamente se destaca a tevê Globo.
Francisco Costa
Macaé, RJ, 28/12/2015.
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