segunda-feira, 12 de junho de 2023

Retorno



Que se explodam as mazelas
deste corpo que me limita.
Preciso da minha poesia
como preciso de água
ou de ar.

Meu coração pássaro
voa o ontem, o hoje
sonhando o amanhã
e no silencio da ausencia
ainda me sei saudade
ainda te sei Amor.


Cristina Manga in Momentos e Ventos

segunda-feira, 21 de novembro de 2022

ELEIÇÕES 2022

Amanhecemos na primavera. A Esperança e o Amor venceram o medo, o autoritarismo e a 

Recuperamos o orgulho de ostentar nossa bandeira e até a nossa "amarelinha" que sempre foi de todos os brasileiros.

Renascemos no sonho de uma nação mais justa, fraterna, igualitária e livre! Renascemos no orgulho de nossa pluralidade, da nossa cultura, dos nossos sonhos de nação. 

Viva a Democracia!

Viva o Brasil!

VIVA O POVO BRASILEIRO!


sábado, 19 de fevereiro de 2022

PETRÓPOLIS 2022

 


Pensando...

Diante da tragédia terrível de Petrópolis, o que vemos? Solidariedade e esforços dos moradores em massa. E o governo? Quantas guarnições  de bombeiros? Governo federal libera FGTS, ou seja, a vítima que pague os custos. E as Forças Armadas? Não  estamos em guerra,  ganham dos nossos impostos, tęm máquinas , equipamentos, homens em abundância e? Os moradores escavando sozinhos com as māos?!

Foi a maior chuva  da história  e?  Onde estão  nessa hora as "instituições "?

Discurso de "lamento muito" não  resolve nada. Gente viva soterrada morreu porque bombeiros demoraram e não  tinham serras... E quantos eram para atender mais de 80 deslizamentos? Quantas mais teagédias anuais vamos ver por absoluta falta de política habitacional? Crescimento desordenado das cidades? Construções  em áreas de risco por total falta de opção e total descaso das "autoridades"?

Até quando?

Até quando o povo brasileiro vai chorar calado?

Cristina  Manga

segunda-feira, 23 de agosto de 2021

UMA LEITURA

 


Amanhã é um dia que não existe , por isso, as decisões e atitudes do “agora” são capazes de nos transformar e ecoar através do tempo. Conhecer a trajetória de Joana e sua potência intuitiva, diante de suas peripécias, nos convida a experimentar a vida e aproveitá-la com a carga do ser independente perante suas surpresas e armadilhas cotidianas que tentam aprisionar.

Com a ousadia de ser livre "Joana sempre foi vento, e como tal espalha sementes, e seu solo são todos os solos que queiram acolhê-las." (MANGA, 2020, p.17) Por meio de nuances metafóricas, bem-humoradas e conscientes é elaborada a história de uma mulher latino-americana, que como muitas resistem a posturas machistas dentro de um contexto patriarcal e conservador. Observamos a constituição da identidade da protagonista a partir das histórias de seus avós para na sequência visualizarmos o estigma de Joana tomando forma de liberdade do ser.

A escritora, professora e socióloga, Cristina Manga, a nossa Cris, propõe uma narrativa rica e consistente em que o momento histórico e suas problemáticas culturais, religiosas, políticas e econômicas são descortinadas, situadas em tempo e espaço latino-americano. Nesse caso, a história individual de Joana é exposta dentro de um cenário coletivo complexo, o qual ao longo da trama percebemos a configuração de repetições de problemas envolvidos por padrões de comportamentos socioculturais da história até os dias de hoje, e que Joana em sua tomada de consciência crescente desvela e toma as rédeas de sua vida própria, uma feminista em práxis.

O livro nos presenteia a sensação de uma companhia intrigante em constante autocrítica da protagonista. Como não admirar o espírito curioso tenaz de Joana? Mulher intensa, por isso assustadora para muitos, que não suportam sair do raso. Joana é mergulho profundo, assim como seu jeito de olhar as pessoas e o mundo. Não se entrega a poderes que manipulam. Provoca através de sua capacidade de ser leal a seus ideais e verdades: "Se uma casa não aguenta a ventania e ameaça ruir, de quem é a culpa? Do vento? Ou da fragilidade da casa? Com certeza é da casa! Então resolvi soltar meus ventos!" (MANGA, 2020, p.203)

Livânia Régia


terça-feira, 23 de março de 2021

LANÇAMENTO LIVRO FÍSICO

 


Finalmente o meu livro "Amanhã é um dia que Não Existe" está disponível IMPRESSO  e à venda no site da @uiclapbr! Segue o link: https://loja.uiclap.com/titulo/ua5508/

#MeuLivroNaUiclap



sexta-feira, 25 de setembro de 2020

POEMA-CARTA PARA UMA IRMÃ DISTANTE

 


Te escrevo como quem dança
porque te escrevo na emoção
das tuas confissões de amor
em forma de poemas.

Sob três eixos deslizam
tuas lembranças
com olhares mouros
cheiros de casa da gente
referências de existências
resistentes
existenciais
delicadas e vitais
como o mar
que se multiplica em nomes.

Escrevo na emoção
de teus versos
passeando por mim
a desenhar as múltiplas
faces do Amor
que os ventos não levam
e o tempo não apaga.

Que mais posso dizer-te
maior do que este sentimento
que se expande e nos irmana?

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos")


segunda-feira, 21 de setembro de 2020

AMANHÃ É UM DIA QUE NÃO EXISTE

 


É com muita alegria que convido todos(as) vocês a lerem meu primeiro romance já disponível no link abaixo. Espero que gostem, comentem e divulguem.

http://bit.ly/amanha-e-um-dia-que-nao-existe


sexta-feira, 4 de setembro de 2020

SEMPRE

 


Para Sueli Cordeiro

Recomeçar e recomeçar
tantas vezes quanto necessário for
posto que viver é imperativo
e não a dor.

Reinventar a vida
tantas vezes se preciso
porque cicatrizes são raízes
que apontam estrelas
e despertam amanhãs.

Transformar
Reinventar
Renascer nessas manhãs
na certeza de ser
caminho de chegada
nunca aceno de partida.

Juntando dores e amores
permanecer
e renascer!

Cristina Manga

(in "Momentos e Ventos")

domingo, 31 de maio de 2020

UM CANTINHO DE RAFAELA - AINDA GOSTO DE DESENHAR

E gosto muito de mostrar meus desenhos e conversar com meu pai. Estando tão longe a internet é ótima para isso!


E como a gente se diverte!

Estes são os últimos desenhos













sexta-feira, 20 de março de 2020

UM MOMENTO BOM!


Nestes dias de preocupação e tristeza com tantas perdas em todo o mundo, não consigo deixar de pensar, sempre que as coisas estão muito ruins algo acontece que muda as condições existentes. Assim foram vários momentos na história, desde tempos bíblicos. Não é diferente agora. 

Vivemos em sociedades que por séculos vem sendo controlada por interesse do capital, levando as pessoas a uma postura de indiferença com relação aos outros, onde ter é a condição de sucesso. Fomos incentivados ao individualismo, de modo a sermos consumidores contumazes de mercadorias. Nos tornamos e tornamos os outros mercadorias. E todo o sistema, preocupado com acumulação de capital independentemente da qualidade de vida de todos. Como se fosse natural que uns tivessem muito e outros apenas para servir aos primeiros. Quem não obtivesse sucesso seria apenas por sua própria incapacidade. Um mundo de falsas ideias alimentado por falsas afirmativas que hoje começam a desmoronar. 

Um ser microscópico derruba todas as teorias liberais e neoliberais. A privatização não consegue garantir saúde a ninguém e todos os países estão combatendo esta pandemia com os recursos dos estados. Todos os resultados positivos de combate estão acontecendo em órgãos de pesquisa dos estados e das universidades estatais. E somente elas de fato. A teoria de que privatizar melhora cai por terra totalmente. 

Um ser microscópico derruba o individualismo e proclama o coletivo. Ou você cuida do outro ou você morre! Incrível, não é? De nada adianta teu dinheiro, tua casa e teu carro. Você vai ter que cuidar do mendigo ou vai morrer com ele! Não pode estocar alimento além do necessário, porque todos terão que comer. Não pode estocar álcool em gel porque todos precisam se desinfetar. Vai ter que recorrer ao SUS que muitos queriam privatizar e darão graças a Deus por ele existir. Não poderão mais achar que são os pobres que transmitem doenças, porque você e muitos ricos poderão ser portadores. Incrível, não é? Precisamos um ser microscópico para nivelar todo mundo e colocar a todos na condição de seres humanos. Ou curamos a todos, ou morremos! 

Sem dúvidas vivemos um grande momento! Doloroso sim.Tenebroso sim! Mas que bom momento para cairmos na real e mudar paradigmas que só conduziram nossas sociedades à destruição do meio ambiente e de nós mesmos? Se não nos conscientizamos diante da morte, o que nos fará cair na real? 

Fico me lembrando daquela frase que todos ouvimos “o que não se aprende pelo bem, aprenderá pelo mal”. Será que teremos que viver mais pandemias para entender que somos todos um? Que governos são para cuidar de todos e não para enriquecer alguns? Que escolher governantes capazes não é escolher para ser contra outros? Que somos responsáveis por tudo que escolhemos fazer ou não? Que a terra e os frutos da terra são para todos os homens e não só para alguns? 

Um bom momento este! Não é sem tempo que paremos para mudar as estruturas arcaicas, malignas e egoístas das sociedades que vivemos. Ou então morreremos todos mais cedo ou mais tarde de uma pandemia qualquer.

Cristina Manga
(in "Crônicas")


sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

AS RATOEIRAS E NÓS



Conhecem a história da ratoeira?

Um rato olhando pelo buraco na parede vê o fazendeiro e sua esposa abrindo um pacote. Ficou aterrorizado quando descobriu que era uma ratoeira.

Foi para o pátio da fazenda advertindo a todos:

- Tem uma ratoeira na casa, uma ratoeira na casa!

Porém, a galinha, que ciscava, levantou a cabeça e disse que não lhe dizia respeito, pois ela não corria perigo por causa da ratoeira. O cordeiro foi sarcástico, dizendo que ia orar pela alma dos ratos. O boi mal deu ouvidos a um animalzinho tão insignificante. Então o rato voltou para a casa, cabisbaixo e abatido, para encarar a ratoeira do fazendeiro.

Naquela noite ouviu-se na casa um barulho característico: a ratoeira aprisionara sua vítima. A mulher do fazendeiro correu para ver o que a armadilha havia pego. No escuro, ela não viu que a ratoeira pegou a cauda de uma cobra venenosa. A cobra picou a mulher.

O fazendeiro a levou imediatamente ao hospital. Ela voltou com febre. Achando que uma canja confortaria sua esposa, o fazendeiro pegou seu cutelo e foi providenciar o ingrediente principal - a galinha.

Como a mulher continuava mal, amigos e vizinhos vieram visitá-la. Para alimentá-los, o fazendeiro matou o cordeiro.

A mulher não melhorou e acabou morrendo. Muita gente veio para o funeral. O fazendeiro então sacrificou o boi para alimentar todo aquele povo.

Na próxima vez em que você ouvir um companheiro dizer que está diante de um problema e acreditar que isso não lhe diz respeito, lembre-se: quando há uma ratoeira na casa, toda a fazenda corre risco.

O autor é desconhecido, mas é o que nos acontece quando achamos que o bombardeio americano no Irã não tem nada a ver conosco. Quando pensamos que violência policial só acontece em favela e não estamos lá. Quando agridem um gay, ou prendem um inocente porque é negro, quando uma mulher é agredida, quando queimam a Amazônia, quando insultam um professor, quando um presidente mente e fingimos ignorar, quando um juiz faz coisas ilegais e usa a lei em proveito próprio ou de seus comparsas e nada fazemos e até desculpamos. Quando todos os dias viramos as costas para a realidade por comodismo ou conveniências, somos como a galinha, o cordeiro, ou o boi. Estamos indo para o matadouro.

Ou começamos a entender que o Irã é na esquina de casa, que governo é para servir ao conjunto do seu povo e não só para alguns, que todas as pessoas têm direitos e devem ser respeitadas, mesmo que não goste delas, ou sem dúvida sucumbiremos todos e não teremos para onde correr. Porque uma coisa é certa: todos sem exceção pagaremos a conta dos atos transloucados dos governantes. Aliá, já estamos pagando.

Cristina Manga
(in “Crônicas”)
02/01/20

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

POR UMA ESQUERDA QUE DISPUTE O IMAGINÁRIO

É preciso enfrentar o neoliberalismo onde ele foi mais fundo: a construção da subjetividade egoísta, ultracompetitiva, insensível ao outro e ao mundo. Árdua, e frequentemente abandonada, esta luta é possível, e há pistas de como fazê-la






Por Christine Berry | Tradução: Simone Paz
“A economia é o método: o objetivo é transformar o espírito”. Entender o porquê de Margaret Thatcher ter dito isso é fundamental para compreender o projeto neoliberal — e como devemos caminhar para além dele. Um artigo de Carys Hughes e Jim Cranshaw propõe um desafio crucial para a esquerda com respeito a essa questão. É muito mais fácil contar para nós mesmos uma historinha sobre o longo reinado do neoliberalismo, povoada unicamente por elites onipotentes que impõem sua vontade sobre as massas oprimidas. É muito mais difícil enfrentar com seriedade as maneiras pelas quais o neoliberalismo criou o consentimento popular para levar a cabo suas políticas.
A esquerda precisa reconhecer que alguns aspectos da agenda neoliberal tornaram-se inquestionavelmente populares: ela teve sucesso em atingir os instintos das pessoas sobre o tipo de vida que gostariam de levar e envolveu esses instintos numa narrativa convincente sobre como deveríamos enxergar a nós mesmos e às outras pessoas. Precisamos de uma estratégia coerente que substitua essa narrativa por outra, capaz de reconstruir ativamente nossa própria imagem coletiva — transformando-nos em cidadãos empoderados, participantes de comunidades movidas por cuidado mútuo — em vez de indivíduos egoístas, donos de propriedades e que competem nos mercados.
Como observam Chantal Mouffe e Ernesto Laclau, teóricos gramscianos, nossas identidades políticas não estão “dadas”, não emergem diretamente dos fatos objetivos de nossa situação. Todos ocupamos uma série de identidades sobrepostas em nossas vidas cotidianas: como trabalhadores ou chefes, locatários ou proprietários de casas, devedores ou credores. Qual dessas identidades define nossa política? Isso depende das lutas políticas por sentido e poder.
Parte do trabalho da política — seja nos partidos ou movimentos sociais — está em nos mostrar como nossos problemas individuais têm origem em questões sistêmicas e como eles podem ser confrontados de forma coletiva se nos organizamos em torno dessas identidades. Assim, a dívida deixa de ser uma fonte de vergonha e passa a ser uma injustiça contra a qual os devedores podem se organizar. As lutas que envolvem o cuidado das crianças não são exclusivas ou de culpa individual para os que são pais, mas um problema social compartilhado que temos a responsabilidade de enfrentar em conjunto. O partido-movimento espanhol Podemos foi profundamente influenciado por esse pensamento quando procurou redefinir a política espanhola como “La Casta” (“a elite”) versus o povo, atravessando muitas das fronteiras tradicionais entre direita e esquerda.
Os inventores do neoliberalismo perceberam bem esse processo de criação da identidade. Ao caracterizar as pessoas como egoístas, maximizadoras racionais da utilidade, eles as encorajaram ativamente a se tornarem aquilo. Esse não é um efeito colateral da política neoliberal, mas uma parte central de sua intenção. Como Michael Sandel apontou em 2012, em seu livro “O que o dinheiro não compra: Os limites morais dos mercados, o neoliberalismo comprime os valores divergentes que anteriormente governavam as esferas da vida não mercantis, como a ética do serviço público no setor público, ou o atendimento mútuo nas comunidades locais. Mas esses valores permanecem latentes: o neoliberalismo não tem o poder de apagá-los por completo. É aqui que reside a esperança da esquerda, na fenda de luz através da porta, que precisa ser valorizada.

Os limites da consciência neoliberal

Pensando em como fazê-lo, é muito instrutivo reparar nas formas como os esforços neoliberais para moldar nossas identidades tiveram sucesso — e, também, as formas nas quais falharam. Embora o Right to Buy (“Direito à Compra”) [1] tenha conseguido fazer as pessoas se identificarem como proprietários de casas e estigmatizar moradias sociais, isso não se converteu em um apoio mais amplo a toda a propriedade privada. Embora a propriedade pública tenha se tornado um tabu entre as classes políticas por toda uma geração — muito além do “senso comum” político — as pesquisas mostraram com consistência que isso não foi acompanhado por uma queda no apoio do público à ideia. Em certo nível, talvez por causa do fraco desempenho das entidades privadas, as pessoas continuaram a se identificar como cidadãos com direito a serviços públicos, e não como consumidores de serviços privatizados. O forte e contínuo apego a um Serviço Nacional de Saúde Pública (NHS, na sigla em inglês) sintetiza essa tendência. Isso que tornou possível que o Partido Trabalhista, sob liderança de Jeremy Corbyn, resgatasse o conceito de propriedade pública, já que as propostas do manifesto trabalhista de 2017 para propriedade pública de ferrovias e água — rejeitadas como ridículas pelo establishment político — mostraram-se extremamente populares.
De modo geral, há evidências de que o neoliberalismo, na verdade, não foi bem sucedido em fazer com que nos enxergássemos como acumuladores racionais e egoístas: mas conseguiu nos fazer acreditar que todos os outros eram. Por exemplo, uma pesquisa de 2016 constatou que os cidadãos do Reino Unido, em média, tendem mais para valores de empatia do que para valores egoístas. No entanto, avaliam os outros como significativamente mais egoístas (mais do que eles, e mais do que a média). Contundentemente, as pessoas com um grande “hiato entre ego e sociedade” [orig: “self-society gap”] foram menos propensas a votar e a se envolver em atividades cidadãs, e altamente suscetíveis a experimentar sentimentos de estranhamento cultural.
Esta descoberta nos conduz, tanto para o grande truque da subjetividade neoliberal, como para seu calcanhar de Aquiles. Popularizou-se, com sucesso, uma imagem de “como são os seres humanos”, mas nela muitos de nós não nos vemos representados. Esta pesquisa sugere que nosso mal-estar político é causado não só pelas condições materiais de desempoderamento das pessoas, mas por quatro décadas em que nos disseram que não podíamos confiar em nossos concidadãos. Por outro lado, também sugere que, no fundo, sabemos que esse relato pessimista da natureza humana não corresponde a quem realmente somos — nem a quem aspiramos ser.
Podemos ver um exemplo claro de como isso se desenrola por meio de estudos acadêmicos que demonstram que, num cenário de jogo que apresenta a oportunidade de nos aproveitarmos dos esforços alheios, somente os estudantes de economia se comportaram como os modelos econômicos previam: todos os outros grupos eram mais propensos a compartilhar seus recursos. Treinados para acreditar que os todos os outros são provavelmente egoístas, os economistas acreditam que sua melhor forma de agir é também egoísta. O resto de nós ainda conserva seu instinto de cooperação. Isso não deveria nos surpreender: afinal, como George Monbiot argumenta em Out of the Wreckage, a cooperação é a principal estratégia de sobrevivência da nossa espécie.

O que é o “Direito à Compra”?

O desafio para a esquerda é encontrar políticas e narrativas que explorem esse sentido latente do que nos torna humanos — Gramsci chamou-o de “bom senso” — e usá-lo para derrubar o “senso comum” neoliberal. Ao fazer isso, devemos estar cientes de que estamos competindo não apenas com uma identidade neoliberal, mas também com uma nova extrema-direita que busca promover identidades de grupo preconceituosas, patriarcalistas e colonialistas. Como enfrentaremos isso é a pergunta de um milhão de dólares e ainda não temos a resposta.
O uso que Margaret Thatcher deu a políticas emblemáticas como o “Direito à Compra” foi uma aula de mestre nesse quesito. Enganosamente simples, tangível e fácil de entender, o Right to Buy também comunicou uma história muito mais profunda sobre uma nação de indivíduos proprietários — cimentando a propriedade da casa como um símbolo cultural de aspiração (pelo direito de pintar sua própria porta da frente), dando a milhões uma participação financeira imediata em sua nova ordem. Quais poderiam ser as políticas emblemáticas equivalentes para a esquerda de hoje?
Até agora, talvez um dos esforços mais significativos neste rumo seja a proposta dos “Fundos de Propriedade Inclusivos”, desenvolvida por Mathew Lawrence num relatório para a New Economics Foundation. Exigiria que as empresas transferissem ações para um fundo, dando aos trabalhadores uma participação coletiva que aumentaria com o tempo e pagaria dividendos aos funcionários. Assim como o “Direito à Compra”, além de mudar a distribuição material de riqueza e poder, visa construir nossa identidade como parte de uma comunidade de trabalhadores que assumem um controle mais coletivo sobre suas vidas profissionais.
Mas essa ideia não nos leva tão longe assim. Ela bem que pode se aproveitar do desejo das pessoas por mais segurança e empoderamento no trabalho, somada a uma participação no que fazem, oferecendo um benefício bastante abstrato que só se ganharia com o tempo, à medida em que os trabalhadores adquirissem uma participação suficientemente alta para ter opiniões significativas sobre as estratégias da empresa. Porém, para aqueles que estão no extremo de um mercado de trabalho opressivo e precário, não significa muita coisa. A menos que também lidemos com as preocupações mais urgentes que enfrentam, como as práticas de exploração de gigantes como a Amazon ou o estresse causado por trabalhos intermitentes. Ainda não temos uma ideia que possa competir com a mudança transformadora da vida das pessoas, oferecida pelo “Direito à Compra”.
O que mais está em jogo? Talvez, quando se trata da vanguarda do novo pensamento da esquerda sobre essas questões, o local de trabalho não esteja exatamente o foco da ação — ou, pelo menos, não diretamente. Talvez precisemos explorar o desejo das pessoas de escapar dessa “corrida de ratos” para termos mais liberdade e ir atrás das coisas que realmente nos fazem felizes: tempo com nossas famílias, acesso à natureza, espaço para cuidar de nós mesmos, conexão com nossas comunidades. A semana de trabalho de quatro dias (sem redução de salários) tem um potencial real como política emblemática nesse quesito. Os conservadores e a imprensa de direita podem estar fazendo piadas sobre o Partido Trabalhista ser “preguiçoso” e “imprudente”, mas no fundo podem estar amedrontados. Eles não conseguem fugir ao fato de que a maioria das pessoas gostaria de gastar menos tempo no trabalho.
Se comunicada com eficiência, esta ideia tem todo o potencial para ser uma profunda política anti-neoliberal, que incorpora uma nova narrativa sobre o que aspiramos a ser, tanto individualmente como em sociedade. Onde o neoliberalismo se aproveitou do desejo das pessoas por uma maior liberdade pessoal e capturou o sentimento, ligando-o à aquisição de riqueza, à propriedade e à escolha do consumidor, nós podemos focar na liberdade para vivermos a vida que realmente queremos. Em vez de oferecer liberdade através do mercado, podemos oferecer libertação do mercado.
Os proponentes da Renda Básica Universal costumam argumentar que ela desempenharia uma função semelhante à de libertar pessoas do trabalho e de nos independizar de sermos sustentados exclusivamente pelo mercado de trabalho. Mas, em termos materiais, é improvável que uma Renda Básica possa ser definida ao nível para que realmente ofereça às pessoas essa liberdade, pelo menos a curto prazo. E, em termos narrativos, a Renda Básica é, na verdade, uma política altamente maleável, igualmente suscetível de ser cooptada por uma agenda liberal. Mesmo na melhor das hipóteses, não deixa de ser uma política sobre a redistribuição da riqueza já existente (embora em maior escala do que a do Estado de bem-estar social). Para derrubar o neoliberalismo de verdade, precisamos ir além disso e falar sobre propriedade coletiva e criação de riqueza.
As políticas focadas num controle coletivo dos ativos das empresas podem ter um efeito maior e melhor se substituírem a narrativa sobre propriedade individual por outra, que destaque a concentração real da riqueza e da propriedade nas mãos das elites — e a necessidade de recuperar esses ativos para o bem comum. Além dos Fundos de Propriedade Inclusiva, outra maneira de fazer isso é através dos Fundos de Cidadania, que socializam ativos lucrativos (sejam recursos naturais ou intangíveis, como dados) e usam esses recursos para pagar dividendos a indivíduos ou comunidades. Os Serviços Básicos Universais — por exemplo, políticas como ônibus públicos gratuitos — podem ser outra ideia atrativa.
Para finalizar, gostaria de lembrar os trabalhos de assistência à Saúde e de cuidados, pois são uma área crítica e merecem mais atenção para desenvolver políticas emblemáticas e convincentes — seja em assistência universal à infância, assistência a idosos ou apoio a prestadores de cuidados não remunerados. O apego instintivo que muitos de nós sentimos a um Sistema Nacional de Saúde público precisa ser ampliado para promover um direito mais amplo de cuidar e ser cuidado, enquanto resistimos firmemente à comercialização do cuidado. Embora o cuidado seja muitas vezes marginalizado no debate político, eu, como mãe recente, tenho plena consciência de que ele é fundamental para que milhões de pessoas possam viver a vida que desejam.
Em uma população envelhecida, a maioria das pessoas já passou pela pressão que significa ter que cuidar de alguém — seja pai ou filho. Ao falar dessas questões, afastamos a discussão política sobre o trabalho valorizado pelo mercado e trazemos a do trabalho que todos sabemos que realmente importa. Afastamos a discussão sobre a competição por recursos escassos e nos aproximamos do debate sobre nossa capacidade de cuidarmos uns dos outros. É exatamente onde a esquerda precisa estar.
[1] Política introduzida no Reino Unido em 1979, no início do governo Margareth Thatcher. Visava combater o sistema, até então majoritário, de moradias possuídas pelo Estado, mas locadas pelos cidadãos, que pagavam aluguéis módicos, por períodos de 99 anos. Significava que os moradores com dinheiro para tanto tinham, a partir de então, o “direito” de adquirir propriedade sobre o imóvel, e transformá-lo em bem pessoal, negociável nos mercados financeiros [Nota de Outras Palavras]

terça-feira, 31 de dezembro de 2019

2020


Não vou desejar Felicidade no ano que começa, porque Felicidade não é uma bênção concedida, é uma escolha e não posso escolher por você. Desejo que escolha ser feliz à revelia. 

Não vou te desejar Prosperidade, porque ela é a conseqüência do teu esforço e trabalho e não posso fazê-lo por você. Desejo que você tenha todos os dias a capacidade de trabalhar e lutar por sua prosperidade e que sempre tenha bons companheiros nessa luta. 

Não vou te desejar Paz, porque ela é resultado da tua vivência no mundo, com coerência, verdade, honestidade, sinceridade e amor por tudo e todos que existem. Desejo, portanto, que você consiga sempre viver os dias com esses amigos. Sendo um indivíduo, possa sempre ser coletivo.

Não vou te desejar Saúde, porque ela é resultado de tudo que você viveu. Desejo que você sempre tenha acesso a tudo que seja necessário para ter saúde!

Não te desejo Realizações, porque elas não caem do céu como bênçãos. Te desejo que sejas sempre capaz de sonhar e lutar pelos teus sonhos, sem nunca deixar de lutar pelos sonhos dos outros. Somos seres coletivos e o bem comum é o que nos faz humanos.

Não vou te desejar Amor, porque ele já mora em você há muito! Te desejo que saiba viver o Amor por tudo e todos, á revelia de qualquer circunstância. Essa força que tudo transforma, que tudo cria, que une, que não discrimina, que cura, que se entrega, que não pensa em si, que sonha o todos, para todos, e não desiste.

Te desejo que sempre seja grato à vida por tudo que ela te da como oportunidade de aprender o que não saiba ainda.

Assim tenho certeza de que 2020 será um grande ano pra você!

Com Amor sempre!
Cristina Manga
(in "Crônicas")


sexta-feira, 13 de dezembro de 2019

As Cartas do Pai por Ivan Cosenza

A Pirralha E O Presidente
Rio de Janeiro, 10 de Dezembro de 2019.

Pai,
Hoje queria te contar uma fábula.
Era uma vez,
um presidente que foi eleito divulgando Fake News.
Não entendia de economia.
Não entendia de educação.
Não conhecia da história do seu país.
Negava a Ditadura Militar.
Era a favor de tortura e tinha como ídolo um torturador e estuprador.
Era a favor do desmatamento da maior floresta do mundo, para exploração mineral.
Era racista, homofóbico, xenófobo e machista.
Defendia fazendeiros proprietários de terras contra invasores, mas queria tirar terras dos primeiros proprietários de terras do seu país, os índios!
Em uma bela manhã de sol, invadiram as terras desses índios e mataram algumas lideranças indígenas, no país deste presidente.
Foi então que surgiu uma pirralha.
Greta, era o nome dela.
A pirralha, reconhecida mundialmente por sua militância climática, denunciou a morte desses índios.
Mostrou em seus discursos, que entendia do que estava falando.
O presidente que não entendia sobre nada, disse que a pirralha que não sabia do que estava falando.
O presidente disse que o país era dele, mesmo não entendendo sobre nada do seu país.
Disse enfim que a imprensa não tinha que dar espaço para uma pirralha.
FIM

Moral da história:
A Pirralha foi eleita a Personalidade do ano.
O presidente foi eleito o idiota do ano.


* Produtor cultural, presidente do Instituto Henfil, filho e curador da obra de Henfil 
http://www.vermelho.org.br/coluna.php?id_coluna_texto=10384&id_coluna=173


segunda-feira, 9 de dezembro de 2019

EPÍGRAFE do livro MOMENTOS E VENTOS





Nada é para sempre, dizemos, mas há momentos que parecem ficar suspensos, pairando sobre o fluir inexorável do tempo.
    José Saramago

Nos piores momentos lembre-se: quem é capaz de sofrer intensamente também pode ser capaz de intensa alegria.
    Clarice Lispector

A distinção entre passado, presente e futuro é apenas uma ilusão teimosamente persistente.
    Albert Einstein


Alice: Quanto tempo dura o eterno?
Coelho: As vezes apenas um segundo.
    Lewis Carroll

DEDICATÓRIA do livro MOMENTOS E VENTOS



Este livro
aos momentos da vida
que vão marcando tempos
e aos ventos que trazem e levam
esses momentos.
   Cristina Manga


RESISTÊNCIAS

 




Mentira do sonho 
ou das histórias 
que brotam como fonte 
das minhas memórias? 

Entranhadas na pele 
desgarram das entranhas 
e se negam a partir 
a parir o não 
a compartir esse chão 
sem vida 
sem sonho 
sem gozo 
sem pão. 

Resisto. 
Renasço no grito 
que sufoco.

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos"·

domingo, 8 de dezembro de 2019

ABENÇOADA




Bendita seja minha memória!
Fonte de vida
que me faz humana.

Bendita seja
por colorir e preencher
meus ocos cotidianos
lembrando trajetórias

Abençoada seja sempre
pelo Amor vivido
vivo ainda
sentido da minha história

Bendita seja
porque me acorda
e me dorme
me sonha e me proclama.

Bendita seja a minha memória!

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos")


A hegemonia pentecostal no Brasil



Bispo Edir Macedo, missionário R. R. Soares, apóstolo Estevam Hernandes, pastor Silas Malafaia, bispo Valdemiro Santiago, pastora Damares Alves, apóstolo Rina, pastor Marco Feliciano, apóstola Valnice Milhomens, pastora Cassiane. O que essas lideranças religiosas, destacadas por mídias brasileiras, têm em comum? São pentecostais, o segmento religioso cristão que mais se expandiu, numérica e geograficamente, no Brasil nas últimas décadas. Hoje, compreender o pentecostalismo é imprescindível para quem se interessa pelas dinâmicas socioculturais e políticas que envolvem o país.

O pentecostalismo é uma das ramificações evangélicas formada por uma variedade de grupos, desde grandes igrejas, como a Assembleia de Deus (que também tem suas divisões), até pequenas denominações de uma única congregação, como a Igreja Evangélica Pentecostal Maná do Céu, em São Vicente (SP), e tantas outras vistas Brasil afora.

Evangélicos pentecostais e neopentecostais

O segmento evangélico é bastante diverso. Tem origem na Reforma Protestante do século 16 que abriu caminho para o surgimento de luteranos, congregacionais, presbiterianos, batistas, metodistas, anglicanos. No século 20, surgiram os pentecostais, expressão de um movimento de protesto contra o racismo e o classismo nas Igrejas, e de afirmação da população negra, migrante, feminina e pobre nos Estados Unidos.

Os primeiros evangélicos chegaram ao Brasil por meio de missionários estadunidenses, na primeira metade do século 19. A identidade “protestante” nunca foi bem afirmada por boa parte deles, que sempre optaram por se denominar “evangélicos”, reforçando disputas religiosas com o histórico catolicismo romano ao colocarem-se como detentores “do verdadeiro Evangelho”.

Atualmente, o grupo mais significativo desse mosaico religioso são os pentecostais. Representam a maior fatia numérica (são cerca de 60% dos evangélicos, segundo o Censo de 2010), com presença geográfica importante, ocupação de espaço nas mídias tradicionais (rádio e TV) e intensa atuação na política partidária.

O que diferencia evangélicos pentecostais dos históricos é a crença no segundo batismo, uma experiência mística atribuída à ação do Espírito Santo, que leva os fiéis a falarem línguas estranhas como sinal de sua presença. Essa ação do Espírito Santo também atribui dons especiais, como profecia e cura pela oração.

Missionários trouxeram o pentecostalismo ao Brasil na primeira década do século 20 e se estabeleceram no Pará (suecos, Assembleia de Deus) e em São Paulo (estadunidenses, Congregação Cristã do Brasil e Evangelho Quadrangular). A partir dos anos 1950, com os intensos movimentos migratórios do campo para as cidades e o processo de industrialização do país, surgiram as igrejas pentecostais fundadas por brasileiros, como a Casa da Bênção, a Brasil para Cristo, a Deus é Amor, entre outras. Várias delas tiveram em programas de rádio um importante apoio para disseminar sua fé.

A ação pentecostal no país é historicamente marcada por presença mais voltada à população empobrecida e às periferias das cidades. Essa prática tornou possível maior enraizamento nas culturas populares, com lugar garantido para a emoção e expressões corporal e musical, ainda que marcada por um puritanismo de restrições morais e culturais. Isso deu aos grupos pentecostais condições de consolidação nos espaços religiosos e crescimento numérico mais expressivo.

Mas o boom pentecostal, de fato, ocorreu a partir da década de 1980 e transformou significativamente o perfil do segmento evangélico brasileiro. Essa expansão tão marcante tem alicerces nas transformações do mundo naquele período. Foi o momento dos processos de derrocada do socialismo, simbolizado pela queda do Muro de Berlim, e a consolidação do capitalismo globalizado e da cultura do mercado, baseados na lógica da plena realização do ser humano pela posse de produtos e serviços e pelo acesso à tecnologia da informática.

Grupos cristãos estadunidenses adequaram seu discurso à nova ordem mundial e criaram a Teologia da Prosperidade. Ela foi abraçada por uma parcela de pentecostais brasileiros que passou a pregar que as bênçãos de Deus, na forma de prosperidade material (posse de finanças, saúde e felicidade na família), são concedidas aos fiéis que se empenham nas práticas de devoção aliadas às ofertas em dinheiro às igrejas. A elas também é destinada a prosperidade, por meio de amplo número de fiéis, ocupação geográfica, aquisição de patrimônio e influência no espaço público. Os estudiosos da religião dizem que se trata de uma relação de troca com Deus, bem própria do clima social estabelecido pelo mercado neoliberal.

Como essa noção de prosperidade também tem a dimensão da saúde plena, as propostas de cura se amplificaram, bem como se intensificaram as práticas de exorcismo contra os males (demônios) que impedem a felicidade. Isso representou um reprocessamento de elementos da matriz religiosa brasileira com a farta (re)utilização de símbolos e representações do catolicismo e de religiões de terreiros.

Cura, exorcismo e prosperidade tornaram-se marcas de uma nova forma de pentecostalismo, que deixava de enfatizar a necessidade de restrições de cunho moral e cultural para que se alcançasse a bênção divina.

Esse pentecostalismo se expandiu no Brasil pelos anos 1990 e 2000, com a formação de um sem-número de igrejas. Estudiosos da religião denominam essa expressão religiosa de neopentecostalismo, ao qual estão vinculadas as Igrejas Universal do Reino de Deus, Internacional da Graça de Deus, Renascer em Cristo, Mundial do Poder de Deus, Sara Nossa Terra, Bola de Neve, entre as maiores, somadas a inúmeras igrejas autônomas.

O crescimento pentecostal passou a exercer influência decisiva sobre o modo de ser das demais igrejas cristãs. A influência se concretizou de maneira especial no reforço aos grupos chamados “avivalistas” ou “de renovação carismática”, que têm similaridade de propostas e posturas com o pentecostalismo e que, em busca de crescimento numérico, passaram a conquistar espaços importantes na prática religiosa das igrejas chamadas históricas, incluindo a católica.

Mídias, política e mercado

O neopentecostalismo não significa a superação do pentecostalismo clássico do início do século 20. Pelo contrário, a Assembleia de Deus consolidou-se como a maior denominação pentecostal, e é também a maior igreja evangélica do Brasil, em termos numéricos e geográficos, com suas grandes e pequenas divisões em “ministérios”. A Congregação Cristã do Brasil, a Evangelho Quadrangular, a Deus é Amor e a Brasil para Cristo continuam a ter presença significativa em todas as regiões do país.

Entretanto, os grupos neopentecostais ganharam intensa visibilidade por conta da ocupação das mídias tradicionais, como rádio e TV, e dos projetos de participação política.

Na virada para o século 21, pastores e líderes neopentecostais tornaram-se empresários de mídia e detentores do que se poderia chamar “verdadeiros impérios” no campo da comunicação, buscando competir até mesmo com empresas não religiosas historicamente consolidadas (caso das Universal do Reino de Deus, Renascer em Cristo e Internacional da Graça de Deus). Chegou ao ponto de alguns desses grupos religiosos já nascerem midiáticos, isto é, a interação com as mídias passou a fazer parte de sua própria razão de ser.

Ao mesmo tempo, as grandes mídias (seculares) assimilam essa atmosfera e passam a produzir programas, ou parcelas deles, para disputar a audiência evangélica: espaço para a música cristã contemporânea (“gospel”) e seus artistas; patrocínio de festivais e megaeventos de rua; veiculação de programas de entretenimento com temática religiosa (inclusive com a concepção de personagens para telenovelas e criação das próprias telenovelas bíblicas).

A tudo isso se conecta o crescimento de um mercado da religião. Os cristãos tornam-se um segmento de mercado com produtos e serviços especialmente desenhados para atender às suas necessidades religiosas, sejam de consumo de bens, sejam de lazer e entretenimento. Passou a ser possível encontrar produtos os mais variados, como roupas, cosméticos, doces, viagens, filmes e jogos com marcas formadas por slogans de apelo religioso, versículos bíblicos ou, simplesmente, o nome de Jesus. A igreja católica passou a seguir a mesma trilha.

A maior presença dos evangélicos no campo da política partidária é parte desse contexto. Desde o Congresso Constituinte de 1986 e a formação da primeira bancada evangélica e seus desdobramentos, a máxima “crente não se mete em política” foi sepultada. A máxima passou a ser “irmão vota em irmão”.

A atuação daquela primeira bancada no Congresso Constituinte (1986-1989) foi marcada por fisiologismo e pela histórica farta distribuição de estações de rádio e canais de TV aos deputados evangélicos (determinante para a ampliação da presença de pentecostais nas mídias).

Depois de altos e baixos numéricos, decorrentes de casos de corrupção e fisiologismo nas legislaturas pós-Congresso Constituinte, a bancada evangélica consolidou-se como força a partir dos anos 2000, chegando a alcançar 92 parlamentares (88 deputados e 4 senadores) em 2014, e nas eleições de 2018, 94 (85 deputados e 9 senadores), sendo os pentecostais uma força hegemônica.

Essa potência solidificou-se na última década e meia, muito especialmente por conta da força de duas igrejas evangélicas que concretizaram, desde 1986, projetos de ocupação da política institucional do país: as Assembleias de Deus (AD) e a Igreja Universal do Reino de Deus (IURD). Ambas passaram a ocupar, depois de 2003, espaços plenos de poder em partidos (respectivamente o Partido Social Cristão, PSC, e o Partido Republicano Brasileiro, PRB), maior quantidade de deputados e senadores no Congresso, conquistas de cargos públicos, como as nomeações de ministros de Estado de Dilma Rousseff (dois da IURD) e de Michel Temer (dois da IURD), e lançaram dois candidatos à Presidência da República (Marina Silva e pastor Everaldo, ambos da AD). A IURD conseguiu ainda eleger o bispo, ex-senador e ex-ministro Marcelo Crivella como prefeito da cidade do Rio de Janeiro (2016).

Além disso, dois fatos impulsionaram o poder pentecostal na política. Um deles foi a inusitada nomeação do deputado Marco Feliciano (hoje, Podemos-SP) como presidente da comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara, em 2013. Ela culminou no revigoramento de campanhas por legislação pautada pela moralidade sexual religiosa, sob o rótulo “Defesa da Família Tradicional”, contra movimentos feministas e LGBTI, em aliança com a bancada católica. Essas pautas encontraram eco na população conservadora não religiosa e reforçaram movimentos reacionários às conquistas de direitos alcançadas nas últimas duas décadas.

Outro fato foi a eleição do deputado federal pentecostal Eduardo Cunha (MDB-RJ) à presidência da Câmara dos Deputados, em 2015. Representou um poder sem precedentes para a bancada evangélica e facilitou tanto a defesa das pautas descritas aqui como a abertura à concessão de privilégios a igrejas no espaço público. A prisão e a cassação do deputado, em 2016, não afetou significativamente as conquistas políticas da bancada.

Tanto a IURD como a AD ofereceram amplo apoio à eleição de Jair Bolsonaro à Presidência da República em 2018, acompanhadas por outras denominações pentecostais, no rastro das propostas conservadoras apresentadas por ele. Bolsonaro candidatou-se à Presidência com um discurso identificado como cristão, marcadamente evangélico conservador, embora declarando-se católico. Nesse contexto, a bancada evangélica se fortaleceu como interlocutora do novo governo e ganhou representantes nos ministérios da Casa Civil (Onyx Lorenzoni) e da Mulher, Família e Direitos Humanos (pastora Damares Alves), com fiéis alocados em cargos estratégicos no ministério da Educação.

Para refletir

Esse quadro retrata a ampliação da visibilidade pública alcançada pelos evangélicos no Brasil nas últimas décadas, por conta da hegemonia (neo)pentecostal.

É um fenômeno que marca o momento sociopolítico e cultural do país, em que os evangélicos se colocam na arena como bloco organicamente articulado. Eles não são mais “os crentes” ou os grupos fechados de outrora; desenvolvem uma cultura “da vida normal” que combina a religião com presença nas mídias, no mercado, no entretenimento e na política. Um segmento religioso que se vê fortalecido como parcela social que tem suas próprias reivindicações e pode eleger seus próprios representantes para os espaços de poder público.

https://outraspalavras.net/estadoemdisputa/a-hegemonia-pentecostal-no-brasil/

CERTEZAS





Dizem a hora mais escura da noite
é antes do amanhecer.

Creio se aproxima esta hora
onde tudo clareia,
posto que mais escura a noite
não poderia ser.

Pelos caminhos gente
sem colheita do plantio
e torpes proclamando vitórias
que não haverão de ver.

A força oculta dos Sonhos
nesta escuridão de agora
irá renascer robusta
no amanhecer!


Cristina Manga
(in Momentos e Ventos)



CONTRAMÃO




Na contramão
dos fatos
das palavras
das ausências
na contramão
de qualquer razão
eu digo não!

Não vão roubar
os sonhos
não vão matar o Amor
Eu digo não!
Vou continuar na contramão!

À revelia da história
e seus absurdos,
apesar dos surdos
pago feliz o preço
e permaneço.

Sobra ternura
em meus braços
pra aquecer teus passos
no meu abraço
pelo caminho teu.
Assim sou eu.

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos")


É TEMPO...



Quando o tempo
é de esperar o tempo
o tempo passa batendo à porta
com todos os tempos
que já passaram

Tempo que perde tempo
com um tempo que é de agora
quando o  tempo de outrora
pede tempo pra passar

Meu tempo são meus momentos
vivendo os ventos de ser feliz.
Não espero o tempo
que não tem tempo
de criar tempo para sorrir.

Ah tempo tempo tempo
vou ocupar o meu tempo
com coisas que esperam por mim
em vez de perder o tempo
com tempos assim.

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos")


VIDA





No espanto um caminho.
Pedras ou flores não sei.
Vou contente.
Tenho certezas
que me fazem resistente.

Vida brinca sonhos
esconde ou revela,
quando parece finda
renasce
desvela.

Ah Vida!
Como chuva benzedeira
limpa histórias
abençoa memórias
derradeiras.

Á frente um caminho.
Respiro e vou contente.
Tenho certezas
que me fazem resistente.

Cristina Manga
(in "Momentos e Ventos")